Percorrer cemitérios não é meu forte, mas o fato é que o imperador chinês Qin Shihuangdi edificou uma tumba que entrou para a História. Seu túmulo é tão importante como as tumbas das Pirâmides de Giza e do Taj Mahal.
Esses excêntricos mausoléus estão em Xi’an, a 1.200 km de Beijing. Durante mais de um milênio, Xi’an foi a capital do império unificado e sede de 11 dinastias chinesas. A cidade estava situada em uma importante encruzilhada da Rota da Seda e recebia gente de todas as direções.
Qin Shihuangdi, primeiro imperador da dinastia Qin e responsável pela unificação inicial da China no ano 221 A.C., era um tremendo déspota e tentaram assassiná-lo três vezes. Mas seu currículo de obras é grandioso – inclui até parte da Grande Muralha, a qual foi reforçada durante seu reinado. O imperador abriu novas estradas, ergueu palácios, criou sistemas de irrigação e instituiu um severo código penal. Pesos, medidas e moedas foram unificados. O desenho da famosa moedinha chinesa com um buraco no centro data dessa época.
O delírio de grandeza de Qin Shihuangdi fez com que ele começasse a construir seu mausoléu logo que entronado, no ano 246 A.C., com apenas 13 anos de idade. Como parte da crença, ele aspirava levar com ele, no momento de deixar a vida terrena, tudo que fosse importante. O principal para ele era seu exército. Quando morreu em 210 A.C., com 49 anos, toda uma hoste de guerreiros em terracota, em tamanho original, acompanhou-o para a seguinte vida. Mais de 700 mil pessoas trabalharam para montar sua majestosa tumba.
Ver fotografias ou ler sobre os guerreiros de terracota de Xi’an surpreende, mas estar dentro do pavilhão que protege as escavações é uma sensação muito mais impressionante. Três enormes fossas escavadas revelam o estonteante conteúdo. Vou direto à primeira fossa, a maior e a mais rica. Dou de cara com um imenso retângulo aberto no solo de 62 por 230 metros. Boquiaberto, balbucio palavras de admiração, impressionado pela visão. São mais de mil soldados de pé, todos olhando para a frente, como se estivessem prestes a atacar.
Os guerreiros formam onze colunas na direção leste. As figuras humanas são de tamanho natural e variavam de 1,72 a 2,00 metros de altura. Cada soldado tem uma fisionomia diferente: alguns sorriem, outros são mais sisudos; uns possuem barba, outros bigodes. O adorno na cabeça identifica o status: quanto mais sofisticado, maior a posição. Enquanto o torso, os braços e a cabeça são ocos, as mãos e as pernas são moldadas em barro maciço.
Cada peça de terracota é decorada de maneira diferente. Consigo discernir alguns traços de pintura vermelha e amarela que resistiram ao tempo. Segundo os arqueólogos, a tinta foi confeccionada à base de minerais e fixadores, tais como sangue animal ou clara de ovo. Outra análise mostrou que as peças foram cozinhadas em fornos de até 1.000o C de temperatura, demonstrando uma grande habilidade na arte da cerâmica.
Originalmente, os soldados portavam armas verdadeiras, como arcos, flechas, espadas e lanças. Os artefatos de madeira não chegaram aos nossos dias, mas os de bronze e outras ligas foram desenterrados em perfeito estado. Os cavalos em terracota, também em tamanho original, parecem estar vivos e suas bocas abertas sugerem relinchos. Arqueólogos consideram que, se totalmente escavada, essa primeira fossa desvendaria cerca de 6 mil guerreiros, 160 cavalos e 40 carros de guerra.
Fascinante é o fato que o lugar, Qin Ling, a 30 km a leste de Xi’an, só tenha sido descoberto 22 séculos depois de construído. Em março de 1974, um camponês encontrou um pedaço de cerâmica ao furar um poço. Com receio de ter feito algo errado, preferiu chamar as autoridades. Em seguida, chegaram os arqueólogos, sem muitas pretensões. Mas quando ampliaram suas buscas, eles ficaram atônitos: guerreiros e cavalos passaram a brotar da terra diariamente. Se não fosse o poço do camponês, esses tesouros poderiam ainda estar baixo da terra.